segunda-feira, 16 de maio de 2011

O que vem antes

Eu não costumo falar sobre nós dois para as outras pessoas. Demorei muito até mesmo para contar aos meus amigos que nós estamos juntos. Fazia quase um ano já. Eu gosto que seja assim. Só nós dois, com nossos erros e acertos, sem interferências. Talvez eu seja um pouco fechada mesmo. Talvez eu não goste de dividir meus problemas, minhas angústias e as guarde só pra mim. Culpada, confesso.

Sei que você aprecia essa minha discrição e que você gosta do fato de a nossa vida ser só nossa. Como na música que você fez pra mim. Mas eu sei também que às vezes você gostaria que eu me abrisse mais, que eu te contasse mais minhas histórias. Eu não sou tão afável quanto você, amor, e eu gostaria que você me perdoasse por isso, mas eu vou lhe contar uma história.

Eu sempre fui desconfiada, desde menina. E também sempre fui tímida. Na minha adolescência, enquanto todas as minhas amigas saíam pra balada, eu ficava em casa lendo ou assistindo algum filme. Sou assim até hoje, aliás. Também por isso eu nunca gostei de grandes aglomerados de pessoas. Conservo poucos, mas bons amigos. E se eu sempre fui precavida em relação às minhas amizades, que dizer, então, dos meus relacionamentos?!

Você, por exemplo. Eu gostei de você já de cara. Você era bonito, inteligente e me fazia rir. Sem falar no seu jeitinho de menino malandro, que me ganhou fácil, de primeira. Mas nós tínhamos acabado de nos conhecer. Eu só sabia seu nome e que você era lindo, inteligente, divertido e amigo dos meus amigos.  E se sua mãe fosse louca? E se você fosse um bandido? E se seus dentes fossem falsos?

Eu não podia me apaixonar por você! Era muito risco, eu poderia me machucar. Mas eu não conseguia tirar meus olhos de você e você não parava de me olhar. Ainda assim, eu resisti. Tentei ganhar o máximo de tempo, saber tudo, todos os detalhes, vírgulas e reticências sobre você. Até que você se cansou e quase desistiu. Aí o jeito foi eu me arriscar. Pagar pra ver.

Hoje eu sei que sua mãe não é louca nem você, um bandido. E que seus dentes são verdadeiros e você nunca teve cáries. Mas isso só veio depois.

Eu era uma menininha segura, cheia de regras, de certos e errados até que você apareceu. Você chegou e a segurança foi embora, e levou com ela as minhas certezas. Eu não tive escolha. Ou eu continuava me protegendo, sem arriscar, e lhe perdia, ou eu tirava os pés do chão e ia contigo até onde você me levasse.

E você me trouxe até aqui. Você me levou até a balada. Você me levou a questionar a mim mesma e à minha rigidez, às minhas regras tortas. E foi tudo muito natural. Você não forçou nada, só me pediu pra ler o livro, ver o filme antes de julgar.

Eu não deixei de ser eu mesma, não deixei de gostar das coisas que eu gostava antes nem de acreditar em certos valores que eu sempre trouxe comigo. Nada disso. Eu só aprendi que o mundo é maior que o meu criado-mudo.

Isso é o que vem antes e você não sabia. Porque, graças a você, hoje eu conto piadas, ainda que pessimamente, e não me envergonho por isso. Graças a você, eu tenho lugar reservado e cerveja gelada toda sexta no bar do Tonho com meus amigos. Porque eu aprendi a ser mais leve, a não me levar tão a sério. Aprendi a me divertir.

E se eu não lhe conto mais histórias, amor, é porque elas não importam. Elas ficaram no passado. E ainda que eu não seja tão afável quanto você queria que eu fosse, saiba que eu me esforço bastante pra que você sempre saiba o quão importante você é pra mim, que você tem o meu carinho e respeito.

Sua pergunta estava quase certa: não é o que aconteceu antes de você que você precisa saber, mas o que acontece antes de cada beijo seu, de cada sorriso meu, de cada abraço nosso.

Mas essas respostas você já tem, assim como eu. Porque a resposta está no depois. E o depois somos nós.

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