terça-feira, 17 de agosto de 2010

Chuva. Amor, Flor.

...E essa sua mania de chover em mim. Eu tô lá, quieta no meu canto, e de repente...chuva. Eu vou estudar e...chuva. Vou dormir...chuva. Vou comer...chuva. Chuva. Chuva. Chuva. Você. Você. Você. E eu fui poça, fui lago, fui rio, fui oceano, fui mar. Fui amar. Foi tanta chuva! E cada gota se fez flor e você fez de mim seu jardim. Chuva, amor. Flor.

terça-feira, 13 de abril de 2010

As meias

Naquela noite, eu bati na porta da sua casa às 3 da madrugada toda molhada da chuva, toda descabelada, desesperada, aos prantos. Você segurou a minha mão e me puxou para dentro, sem nenhuma palavra, nem mesmo um "tá tudo bem". Então você tirou minha roupa molhada e enxugou o meu corpo, me preparou um chá e sentou comigo na cozinha por duas horas, enquanto eu chorava e, entre uma lágrima e outra, um suspiro e outro, tomava um gole do chá. Quando eu finalmente terminei, você me levou pro quarto e me calçou nos pés uma meia, para que eu me sentisse minimamente confortável e dormisse. Eu nunca lhe disse que dormia de meia quando alguma coisa me incomodava, mas você sabia. Quando eu acordei, você já tinha ido trabalhar, mas deixara tudo arrumado para o caso de eu querer ficar mais um pouco. Nós nunca falamos sobre isso, você nunca me perguntou o que tinha acontecido, mas... Obrigada. Era isso o que eu queria dizer: obrigada. Desculpa a bagunça, desculpa a confusão, desculpa ter molhado o seu sofá. Aquela noite foi realmente muito ruim e eu queria lhe agradecer por ter estado lá por mim, por ter me vestido aquelas meias, elas foram mesmo muito reconfortantes. Aquela noite me tirou algo realmente grande, mas me recompensou com algo ainda maior. Eu enxerguei. Obrigada. Obrigada, amor, obrigada. 

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Bem-vinda

Você era a menininha de tênis e vestidinho florido no bar em plena tarde de quarta-feira. E tinha aquele cara ao seu lado. Vez por outra, você ficava olhando pra ele por vários minutos, depois virava o rosto – com uma expressão mais indecifrável que o sorriso de Monalisa – e contemplava o nada. E eu me perguntava: em que será, Deus, que ela está pensando agora? Eu queria saber, eu queria saber tudo sobre você. E você se levantou e foi embora. Calmamente. Como se fosse nada. Não disse adeus, não disse tchau, não olhou pra trás, não deixou pedaços. Você apenas levantou e foi embora. E eu fui atrás com tanta pressa, com tanta vontade, que nem percebi que você estava parada, acendendo um cigarro, e fiquei lhe procurando feito louco entre os passantes. Não sei o que foi, mas você olhou pra mim e sorriu nessa hora. Deus, eu pensei, ela me viu, ela me sorriu! E eu lá, feito criança quando encontra os pais depois de se perder deles, parado, lhe olhando, todo descabelo, suado, sem acreditar. Nossa, como eu me senti ridículo! Você se aproximou e me ofereceu um cigarro. Um táxi parou, você entrou nele e perguntou se eu iria também. É claro que eu iria! Como diz a mocinha daquele filme, eu fui e vou toda vez que o amor me chamar, eu fui e vou toda vez que você me chamar. Sabe, faz cinco anos que isso aconteceu. Aquele bar não existe mais e o seu tênis rasgou, mas eu ainda lhe vejo de tênis e vestidinho saindo pela porta da frente e fumando seu cigarro como se nada tivesse acontecido. Não sei, não sei bem o que é, não consigo explicar. Mas aquele dia mudou a minha vida. Naquele dia, eu tive certeza que minha vida começava ali e que você estaria nela por um bom tempo. Eu não errei. Eu não deixei você sair da minha vida desde então e você nunca quis ir embora. Você sabe, as coisas nunca foram fáceis pra gente, às vezes eu me pergunto se tudo isso vale à pena mesmo e eu sei que você também se cansa e se pergunta o mesmo, mas é só lembrar aquela menina de vestido florido e tênis me sorrindo na porta do bar que eu sei que tudo vai ficar bem. Então eu consigo fechar os olhos e dormir em paz. É só lembrar o seu sorriso de manhã, a sua voz rouca me cantando um blues e o quarto todo bagunçado. Olha, amor, eu só queria dizer que amanhã você vem morar aqui comigo e eu não consigo dormir, louco de ansiedade pra lhe ver entrar por aquela porta com uma mala na mão e um sorriso no rosto. Olha, amor, eu só queria mesmo dizer que te amo e que os melhores dias da minha vida são os que eu passo contigo. Sabe, amor, estamos apenas começando.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Canções e poemas

Não tinha móveis em casa. Nem uma cama, nem um sofá, nem um armário de espelhos no banheiro. Nada. Nunca os tivera. Gostava da casa assim. Vazia. Era tão livre que não se deixou prender nem pelos móveis. Dividia seu espaço apenas com um colchão inflável, pilhas de livros, uma TV, um aparelho de DVD, um som antigo e o baú. Sorria sempre que entrava lá. Era sempre bem-vinda.

Havia também a parede das fotografias: os pais, os amigos, os lugares, os momentos e ele. Claro, há sempre um ele. Estavam juntos há tanto tempo, há tantos anos que pareciam não lembrar. Mas ele sabia o dia, o mês, o ano e, quem sabe, a hora em que tudo começou. E ela sabia, com todos os detalhes, o exato momento. Lembrava-se bem dele dobrando a barrinha de sua camisa preta para segurá-la diretamente pela cintura e da voz dele dizendo cuidado quando ela tropeçou. Foi há muito tempo mesmo, pensava ela sem pesar, sem orgulho, apenas com amor.

Tinham um amor mudo, desordenado. Ele parecia ter medo de admitir que gostava dela porque ela estava sempre indo embora. E ela estava sempre indo embora porque ele nunca a pediu pra ficar. Viviam assim, então. Viam-se apenas em alguns finais de semana, em que ela abria a porta de casa e ele também se sentia bem-vindo. Terminaram e reataram dezenas de vezes sem nenhuma palavra. Ele simplesmente não aparecia na sexta à noite ou, então, quando a saudade batia, tocava a campainha, ela abria a porta e lá estavam eles, juntos novamente.

Ninguém nunca os imaginou juntos. Não pareciam feitos um pro outro ou mesmo que combinavam. Nem mesmo todos os anos foram capazes de apagar essa impressão. Mas ela sabia que o amaria pra sempre, mesmo quando um ou outro fosse embora de vez, e que voltaria sempre pra ele, bastava ele tocar a campainha.

No fundo, eram parecidos. Ela gostava de filosofia e ele, de saber como tudo funcionava. Ela trocava as lâmpadas e ele matava as baratas. Ele tocava guitarra e ela escrevia contos. Não eram opostos nem complementares. Sabiam-se livres e presos um ao outro. Um dia, participariam do Amazing Race e seriam ótimos pais. Como nunca faziam planos, não podiam dizer se seria juntos ou separados. A vida dela era um poema e a dele, uma canção. Mas a poesia dela precisava do barulho dele. E a música dele precisava da melodia dos versos dela.